O passeio da Julinha O passeio da Julinha - Essa coisinha é gente pra andar sozinha?
A cabecinha loira voltou-se, olhou-me com o olhar desconfiado, parou e ficou a fitar-me. A acompanhante, uma senhora de meia idade, que fiquei sabendo ser a babá, me disse: é assim, não quer mais dar a mão para andar...
Ela tinha um olhar triste. Parecia que duas lagrimazinhas estavam sempre a brotar de seus olhinhos. Dava a impressão de que aquela tristeza era antiga, sua companhia de sempre, porque não se atrapalhava com minha presença, não reclamava, nada dizia. Apenas olhava, um olhar comprido, perscrutador, enquanto a babá matraqueava alguma coisa que eu nem ouvia. Parece que dizia que teria levado a irmãzinha à escola e que estava a dar um passeio com a Julia, mas ela nem queria nada, estava emburrada, mas a mãe mandou etc e tal e falava, falava e eu ali, perto daquela coisinha, tentando fazê-la dar um sorriso que fosse.
E foi aí que notei que seu punho direito estava enrolado com alguma coisa, um pano, uma meia, uma gaze, talvez. -Que foi no bracinho? É pra não chupar o dedo, respondeu a babá. O pai faz assim, porque ela não quer saber de chupeta, só quer o dedinho.
E a pequena Julia, então, olhou pra seu bracinho e fez um biquinho de choro, mas nada disse e seus olhinhos ficaram molhados de novo.
Fiquei ali parada algum tempo, pensando sobre o agir daquele pai. Quem era eu para ditar alguma coisa, para dizer a ele, por meio da babá, que aquilo era uma grande maldade; que era uma meninazinha que nem 3 anos tinha ainda, que ela estava triste (será que ele não via?). Eu nem ouvia o que mais que aquela tagarela da babá falava sem parar.
Afastei-me, sentindo-me impotente, frágil, vencida, diante daquele quadro de tristeza. Dei um adeuzinho pra ela e fui andando, mas com o coração apertado, de ver aquela criaturinha tão inocente e já sofrendo os revezes da vida.
Resolvi olhar para trás. Com surpresa, vi a Julinha levar a mãozinha amarrada aos lábios e mandar-me um beijo com um sorrisinho débil, como se sentisse a minha solidariedade e quisesse me consolar.
Fui para casa, retornei à rotina, mas aqueles olhos tristes ficaram gravados em minha alma.
Maria Francisca – 19 de novembro de 2010.
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